Projeto de Lei de combate às fake news causa discussões no Senado e na Câmara dos Deputados
Parlamentares temem possível censura que pode vir com a aprovação do projeto sem revisão prévia.
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Reportagem escrita por Beatriz Monteiro
No dia 3 de Julho de 2020 foi apresentado na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei 2630/20 intitulado Lei brasileira de liberdade, responsabilidade e transparência na internet, conhecida popularmente como lei das fake news. O objetivo principal da PL é o combate à criação e disseminação de fake news e após várias reformulações, aguarda despacho do presidente da Câmara dos Deputados.
Proposto pelo Senador Alessandro Vieira (CIDADANIA-SE), e após várias versões analisadas, o projeto foi aprovado pelo Senado no dia 30 de junho de 2020 com 44 votos favoráveis, 32 contra e dois abstidos. Mesmo sendo aprovado pela maioria, o projeto causou discussões polêmicas ainda no senado.
Em seu relato o Senador Angelo Coronel (PSD-BA) ressaltou a importância do relatório para combater o anonimato que, segundo ele, é um artifício utilizado para crimes nas redes sociais “Não é admissível que a sociedade brasileira se veja refém daqueles que se escondem, covardemente, atrás de perfis falsos para disseminar mensagens ofensivas.”, afirmou. Dentre os que votaram contra o projeto o Senador Plínio Valério (PSDB-AM) defende a necessidade de melhores discussões a respeito de alguns pontos da PL. “Mas a gente não pode prender todo mundo de uma empresa pra achar o culpado, a gente tem que achar o culpado antes.”, relata o senador a respeito das sanções propostas no projeto.
Após a aprovação pelo senado, a proposta chegou até a Câmara dos Deputados onde causou novas discussões. A principal delas foi sobre a possibilidade de censura advinda com a aprovação da lei. “Criar um aparato estatal para regular o que é verdade, o que é mentira, o que é falso, o que é verdadeiro, isso é censura. Quem vai estabelecer isso?” afirmou o deputado Carlos Jordy (PSL-RJ).
Para o deputado Marcel Van Hattem (NOVO-RS) o foco da proposta não é apenas o combate às fake news, mas dar ao Estado o poder de controlar o que é postado nas redes sociais. “Ela foi feita para defender quem tem poder da opinião daqueles que não têm poder e que têm todo o direito de criticar e de contestar.” afirma Van Hattem. .
Possível Censura?
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A preocupação com a censura vai além das discussões do plenário. Advogados e outros especialistas do meio digital se manifestaram contra o projeto de lei afirmando não haver razão para a PL existir visto que já existem leis que punem a ação de autores de difamações e mentiras no código penal.
Para o advogado Ninrod Monteiro, aprovar a lei apenas aumentaria o controle e censura de conteúdos nas redes sociais “O propósito da lei é muito nobre, nós não podemos deixar isso de lado, só que tem que levar em consideração é: quem vai ser o juiz da verdade? Quem vai avaliar o que é verdade e o que é fake news?”, completa.
De acordo o advogado, o código penal brasileiro já apresenta leis que determinam punição para autores de discursos difamatórios (virtuais ou não) além de mecanismos na Legislação Civil que dão permissão ao cidadão, que se sentir ofendido ou violado por algum discurso de ódio ou desinformação, de fazer uma indenização por danos morais e eventualmente danos materiais. “Não vejo, num caso prático, um efeito tão diferente pras vítimas do que as medidas que já estão previstas e em vigência na nossa legislação civil e penal.”, afirma.
Mesmo com todos esses problemas apontados a PL não foi descartada, mas posta em revisão e reformulação. Uma pesquisa realizada pelo senado mostra que 84% dos brasileiros concorda totalmente ou em parte na criação de uma lei de combate às fake news.
A deputada Fernanda Melchionna (Psol-RS) defende a importância da PL no combate às fake news mesmo que o texto tenha muitos problemas. “Não temos nenhuma dúvida que precisamos seguir o dinheiro e combater os financiadores da mentira”.
Confira a seguir a primeira versão da PL:
Ciclo de debates públicos
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O projeto passou então por um ciclo de debates públicos. Foram cerca de onze debates num período entre 13 de julho e 07 de agosto de 2020. Os temas abordados de cada debate foram:
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Necessidade de lei para combater a desinformação no Brasil;
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Como promover maior transparência e garantir os direitos do usuário;
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Moderação de conteúdos e liberdade de expressão;
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Relação entre patrocínio econômico e impulsionamento de notícias falsas;
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Impactos da desinformação na democracia;
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Identificação de agentes maliciosos sem risco à proteção de dados;
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Combate a desinformação nos serviços de mensagem privada;
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Tecnologia e soberania nacional;
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Financiamento público e privado da desinformação;
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Educação midiática para o mundo hiperconectado;
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Desinformação e discurso de ódio;
Confira todos os debates na playlist Ciclo de debates públicos: Lei de Combate às Fake News: https://www.youtube.com/playlist?list=PLitz1J-q25kM4K1Y-MhzJPGYN3e16ertd
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Após as discussões a mediadora do último debate, deputada Margarete Coelho (PP-PI), resumiu os principais pontos polêmicos discutidos durante o ciclo. “Eu percebo que o grande dissenso que nós temos no tema é sobre as regras previstas para a moderação pelas redes sociais, qual a melhor forma de fazer. Autorregulação regulada, dar mais poder, ou garantir que a porta de entrada seja o poder Judiciário ou se o poder Judiciário deve ficar apenas naqueles momentos dos interesses resistidos, nas omissões das plataformas?”, questionou.
Além disso, foram pontuadas outras questões como a criação de normas infralegais para que a lei não entre em um grau elevado de detalhamento, uma proposta de averiguação dos algoritmos das empresas para a verificação de “racismo algorítmico” e uma atenção especial a perfis pertencentes às minorias (LGBTQIA+, perfis feministas, etc.) que frequentemente são considerados impróprios.
Confira abaixo a entrevista com o advogado Luiz Augusto sobre a PL 2630/20